quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Paul McCartney - eu não fui

Paul McCartney. Com ele, vivo um tórrido caso de amor, desde que ele me roubou de John Lennon, com quem eu tentava manter uma relação monogâmica e feliz. Entendam, John era um prato cheio pra qualquer mulher, com aquele ar meio blasé de rebelde sem causa e seus olhinhos puxados e míopes – embora ele insistisse em andar sem óculos e tivesse, por isso, que apertar os olhos como quem seduz todas ao redor. Ah, John. Você jogou sujo pra me seduzir. Começou com All I’ve Got to Do, e eu não consigo deixar de achar essa música incrivelmente sexy, passou por She Loves You, In My Life, Nowhere Man, Across the Universe e You’ve Got to Hide Your Love Away. Estas foram apenas algumas das cantadas que o malandro usou comigo. E todas funcionaram incrivelmente bem. Claro que ele precisava de um arremate, que foi Girl. Enferma, fui acometida pela síndrome do repeat. Não podia haver nada mais sedutor que a voz de Lennon cantando ‘ah girl, girl...’. Não é? Assim eu pensava.

Então Sir Paul, meio ciumento, não deixou por menos e veio atrapalhar meu momento monogâmico que não durou muito, por sinal. Não me acusem de vira-casaca. O que vocês querem? Paul era o beatle romântico, o mais assediado pelas garotas, o dono de uma voz agressiva e doce nas mesmas proporções... E ele me veio com All My Loving. Eu simplesmente não tive escapatória: ‘close your eyes and I’ll kiss you, tomorrow I’ll miss you…’. E este bendito gentleman me fez o favor de apelar, sedutor em Michelle, romântico em Here There and Everywhere, profundo em Let it Be, visceral em Yesterday e como cartada final, ebriamente apaixonado em Oh! Darling. O que pode uma pobre mortal fã dos Beatles fazer senão declarar a própria sentença de acorrentada? Oh Darling me fez querer encher a cara, berrando a plenos pulmões, escrava daquele baixista miserável e lindo.

Meu dilema enquanto fã de Beatles é eleger um favorito. Amo John, amo Paul, amo George, amo Ringo. John e sua rebeldia meio tarada (nos últimos discos). Paul Ramon e seu romantismo tão popular e doce. George e suas canções que sempre me desestabilizaram porque eram simplesmente geniais (sem falar que o George era um gato). Ringo e sua intimidade com a bateria – que outra pessoa poderia mudar o jeito de segurar as baquetas enquanto sorria e balançava a cabeça? Fora que eu adoro Octopus’s Garden e Photograph. Pronto, falei. Sou polígama, prendam-me. Mas a culpa não é minha.

Só posso imaginar o que sentiram os beatlemaníacos mais antigos, que viveram aquela era de sexo, drogas, rock’n’roll e liberdade criativa, ao assistir a um show de Sir James Paul McCartney e vê-lo ali, uma lenda viva, um dos responsáveis pela mudança da mentalidade da juventude sessentista e das gerações que vieram após. Gostar de Beatles, sendo jovem, é pedir pra sofrer. Lembrar das circunstâncias tão amargas que permearam a dissolução da banda; da pressão que houve por uma reunião em nome dos velhos tempos; da morte prematura e violenta de John Lennon; da derrota para o câncer de George; do fato de que eis uma boa banda que jamais poderá reunir-se outra vez... É tudo triste, nostálgico e definitivo.

Mas dois ainda restam. E na ativa, resistindo bravamente aos anos. Há quem diga que Paul e Ringo já deram o que tinham que dar, eu discordo. Sobretudo quando penso na multidão que foi ao Morumbi aos prantos para ver o ídolo de perto. Paul ainda tem muitas lágrimas a arrancar, fãs de gerações passadas, atuais e futuras, música a compor. Sim, música a compor – alguém já escutou This Never Happened Before, que Paul lançou em 2005? Ainda sai coelho desse mato, e eu espero que muitos.

Infelizmente, acompanhei Paul somente pela TV, abraçada ao meu bichano Paul McCartney – que é? Meu vizinho tinha um gato chamado John Lennon, ok? Essa vida de estudante dependente dos pais é triste quando refreia nossos impulsos e vontades loucas. Faltaram-me recursos, mas não vontade. E não deixei de me arrepiar com a hora convenientemente editada pela Globo de McCartney, Beatles, Wings. Eu me senti parte daquela multidão. Milhões de pessoas choraram o que eu teria chorado se lá estivesse. Obrigada, pessoal. Vocês foram porta-vozes de muitas pessoas que, como eu, desejaram com toda a alma estar lá.

E quanto a você, Paul, obrigada. Let it Be, Two of Us e The fool on the Hill jamais sairão da minha playlist.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

CORÍNTHIANS X CRUZEIRO

Não, não é uma crítica, uma análise ou qualquer coisa que o valha. Não sou perita em futebol, não me arrisco a falar sobre o que mal sei. É um diário, leia-se. Eu já contei como virei Corintiana. Mas é praticamente impossível adotar um time e cuspir fora todos os clubes. Não, vem tudo junto. Pague um, leve mil e tenha um infarte de brinde.

Vasculhamos canais, nada de jogo em TV aberta. Saímos à procura de um bar. No caminho, ouvimos o primeiro tempo quase inteiro pelo rádio. Marinheira de primeiríssima viagem, eu nunca havia escutado futebol pelo rádio. Sou cardíaca, o Ministério da Saúde, desde então, advertiu: não repita a façanha, Isadora.

Antes mesmo de terminar o 1° tempo, achamos um bar que estava transmitindo o jogo. Parecia muito com a partida contra o Palmeiras no Pacaembu. Muitas faltas, muita tensão. Mas diferente daquele domingo, Corínthians ia bem mal em relação aos adversários Cruzeirenses. Nossa estrelinha Bruno César, mal tocou na bola, deixando Dentinho e Ronaldo sozinhos no limbo, digo, no campo. Elias ainda assustou no primeiro tempo e Chicão errava passes por segundo. Júlio César, pra variar, foi o (único) salvador da pátria.

Aí surge a primeira polêmica: Thiago Ribeiro avança na pequena área, tenta driblar Júlio César. Sem sucesso, se JOGA pedindo pênalti. Até aí tudo bem, todo mundo há de ter um Rojas dentro de si, como manda o bom figurino. Problema foi o árbitro não ter macado nada e ainda aplicar cartão amarelo à Ribeiro. Dramático. Os mineiros começam a chiar.

Do outro lado, Montillo aparece com ótima movimentação, contribuindo para a ótima marcação do Cruzeiro. Corínthias só reagiu no 2° tempo. Bruno César, que já não estava fazendo nada mesmo, foi trocado por Jorge Henrique. A torcida alvinegra vibra. Até no bar. Então Júlio César mostra a que veio. Aos 33 do segundo tempo, Wellington Paulista recebe a bola de Fabricio e chuta na cara do gol. O goleiro alvinegro faz umas das mais belas defesas que eu já vi até hoje.

Então aparece a segunda e definitiva polêmica: aos 41 do segundo tempo, eu já estava conformada com um empate. O cruzeirense Gil divide a bola no alto com Ronaldo e o árbitro marca pênalti. Eu, leiga da Silva Santos, perguntava toda hora aos amigos presentes: ‘Por que fulano tá impedido?’; ‘Por que ele tá parado com a bola?’; ‘Por que tá disputando a bola com o ombro?’; ‘Por que isso, por que aquilo?’. Sim, eu era daquelas crianças que perguntava o porquê de tudo e um dia sonhou em se tornar jornalista. Finalmente perguntei: ‘O que caracteriza um pênalti?’. Resposta: uma falta na pequena área.

Se imagem vale mais que mil palavras...

Eu aprendi a amar meu time, como aprenderia a amar um namoradinho. Mas não aprendi a amar minha profissão. Já nasci com ela, é parte de mim. Não quero ficar em cima do muro ao mesmo tempo que acho irresponsável tomar uma postura apaixonada. Mas honestamente, achei discutível. Pareceu falta sim, mas não tão grave a ponto de pênalti. Não sei, que falem os sabidos da Rua do Bobos, Número 0. Ficar histérico por causa de futebol é de-ca-den-te, te falar. Não é como quebrar o pau por causa de política, já falei disso e já estou sendo prolixa.
O que eu sei é que o Corínthians também teve dois gols marcado por Ronaldo Gordo no jogo contra o Guarani anulados. DOIS gols. É muita coisa, colega. O que eu sei também é que o Fluminense saiu da série C para a série A, assim, do nada. E este é o nosso futebol. Não sei exatamente o que isso significa, mas se quer acusar o Timão ou qualquer outro time de fraude e afins, que se prove.

Deixei o oba-oba pra outro dia ou pra fazer em silêncio. Porque parecia funeral. O clima na Rádio Transamérica, que ouvi na volta pra casa, era de revolta, desespero, acusações à torto e a direito. É claro mané, se vc é Palmeirense, São Paulino, Cruzeirense e o-diabo-a-quatro, não leia este texto pra não morrer de sífilis. Eu sei que parece uma justificativa demasiada corintiana, mas a impressão que tenho, é que o mundo tem sempre uma carta na manga contra a gente. Estão todos só esperando, fardados, que o Corínthians morra para poder carregar o caixão e escrever nossa autópsia. O mesmo não se aplica aos outros. Sóoo ao Corínthians. Faz favor, morra no Ganges e não ressuscite. É só um jogo, um campeonato. Ninguém vai morrer de fome independente do resultado. Chororô mais irritante esse. Coisa de bichinha, viu? Fica a dica. 

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Sob a bandeira auriverde



Em agosto desse ano, estive na Alemanha, junto a meu grupo coral. Únicos representantes do Brasil e das Américas, nós competimos num festival internacional de coros e, na categoria folk music, voltamos para casa com o segundo lugar. O interessante é que nenhum dos coros europeus nos acusou de roubar o prêmio ou de ‘não sermos gente’ por nossa nacionalidade. Pelo contrário. Por onde passamos, fomos recebidos da melhor forma possível, e, segundo eles mesmos, deixamos uma marca – uma força e alegria que eles admiram e gostariam de espelhar. Voltamos ao Brasil com o ego mais que massageado e o orgulho de ser brasileiro nas alturas.

Mas, de regresso, o clima que encontramos foi completamente outro. A pátria-mãe já não era mais o lar de brasileiros e embriagados pelo ufanismo sazonal que se dá em todo ano de Copa do Mundo. Embora unidos sob a mesma bandeira, língua, leis e responsabilidade social de eleger os governantes, estamos longe de ser o povo unido que os alemães de Gelnhausen conheceram.

Não há outra palavra para definir o pleito de 2010 que não ‘tensão’. E não apenas entre os candidatos, que mais trocaram ofensas que apresentaram propostas. O clima bélico se estendeu ao próprio povo, ou a uma parcela do povo. Ao que parece, o resto do país – o resto ‘desenvolvido’ do país, diga-se de passagem, e não querendo generalizar. Quero acreditar que os que difundem essa ideia sejam a minoria definitiva – resolveu responsabilizar os nordestinos por toda a mazela que assola o Brasil.

Queridos povos separatistas da nação, desuni-vos. Eu, nordestina, integrante dessa ‘raça’ que foi classificada como analfabeta, cabeça-chata ou outros dos adjetivos carinhosos que nos amam atribuir, vou lembrar-lhes de certos fatos que estou CERTA de que vocês aprenderam na escola. A miséria existe no Brasil desde sempre, ou desde a gênese da história da nação tupiniquim – quando não existiam Nordeste ou Sudeste que nos polarizassem. Somos todos filhos-da-puta, e não estou xingando ninguém. Descendemos de portugueses, ou, sendo mais específica, do proletariado português e das prostitutas que a Coroa enviou para colonizar a nova terra.

Desigualdade social é um mal de toda e qualquer nação construída sob os ditames do capitalismo. Não, esse texto não é nenhum manifesto comunista – apenas um apanhado de fatos que nossos amigos do Sudeste pareceram esquecer. Onde há desigualdade social, meus caros, há fluxo migratório. Ou vocês, descendentes orgulhosos dos italianos, acham que seus antepassados vieram ao Brasil aproveitar o clima tropical? Voltem à escola e estudem história. (Parêntese: também estive na Itália este ano. E, apesar de todo esse papo de berço da civilização ocidental, eu não me orgulharia de descender de um povo tão rude. Fecho parêntese).

Como – e eu repito, como? – disseminar idéias separatistas num país heterogêneo como o Brasil? Não há como enquadrar o brasileiro numa etnia porque somos uma mistura. O Brasil não tem cara, e talvez seja essa a beleza dessa nação de ninguém. Preciso recordar onde o país foi ‘descoberto’, qual foi sua primeira capital e a partir de onde a população começou a se expandir? No fracassado sistema de capitanias, preciso lembrar-lhes de qual capitania, junto à de São Vicente, atual Estado de São Paulo, foi a mais próspera? Preciso lembrar-lhes de QUEM construiu a cidade mais próspera do país depois de todo o estupro das classes mais abastadas minar a riqueza de uma região que tem TUDO – exceto a consideração dos poderosos – para mover a economia do país, tanto quanto o Sudeste? Será que o Estado de São Paulo seria tão próspero sem a mão de obra dos burros de carga aqui? Será que a responsabilidade inteira por girar as molas da economia do Brasil pertence a vocês, apenas?

Isso porque não falei no número de sulistas e sudestinos que estabelecem residência por aqui. E também ‘roubam’ nossos empregos, sujam nossas praias e nós, o que fazemos? Sorrimos e damos as boas-vindas. É um belo toma-lá-dá-cá, não acham?

As mesmas pessoas que nos condenam e que nos chamam de escória ficam indignadas quando um brasileiro é criminalizado no exterior pelo fato de ser latino. Sintam na pele, brasileiros. Não é à toa que nordestino e latino terminam com o mesmo sufixo.

Graças ao bom senso, e à premissa de que ‘toda unanimidade é burra’, a animalização do nordestino não é um consenso. Nessas horas eu até chego a concordar com essas idéias fascistas de separação. Tenho absoluta certeza de que esse país chamado Nordeste mostraria, com louvor, o que é ser próspero de verdade.